Falo de adultos mimados, despreparados para a vida em ambiente coletivo, que deliberadamente querem ter razão, mas não querem ser felizes onde moram.
A dinâmica é quase sempre a mesma. Primeiro, eles colocam seus interesses acima de qualquer coisa. Logo em seguida, expõem suas razões e motivos como verdade absoluta, aproveitando-se de alguma brecha ou lacuna na lei.
Depois, se contrariados, enchem a boca para dar uma carteirada e dizer que seu advogado adotará as medidas judiciais cabíveis e, por fim, orgulham-se do processo e da eventual decisão obtida contra os vizinhos.
Advogando há quase três décadas, ainda não consegui desvendar claramente o que motiva algumas pessoas a buscar o litígio a qualquer custo, ainda que os efeitos do processo sejam nefastos para o lugar que escolheram viver.
No escritório, não raramente, me pego tentando demover alguém de processar os vizinhos e me sinto mais um psicólogo do quem um advogado, utopicamente defendendo a ideia de que o senso comum, o que parece razoável para a maioria, é sempre o caminho menos tortuoso.
Em hipótese alguma quero tolher as legítimas razões de quem tem um direito violado, mas sim evitar a banalização da via judicial, já que a mão fria e pesada do Judiciário nem sempre consegue trazer a tão almejada pacificação social. Sem falar nos custos, na demora, na energia desperdiçada, nas relações rompidas.
Em alguns condomínios, já existe a figura do assediador judicial, aquele vizinho beligerante, que judicializa qualquer tema decidido pelo síndico ou pela assembleia, que se coloca como o baluarte da Justiça, mas que na verdade acirra os ânimos e acaba com o bom ambiente no prédio. Felizmente, se comprovado o assédio judicial, o maníaco por processar vizinhos já pode ser condenado a pagar polpudas indenizações em razão do incômodo causado.
Para ilustrar o tema, vou contar dois casos que estou tratando e que, ao que tudo indica, acabarão no Judiciário.
O primeiro, trata-se de um morador que insiste em usar o carrinho de compras ao chegar do mercado e largá-lo no elevador em vez de levá-lo de volta para o local correto. Advertido, disse que vai processar o condomínio, pois no regulamento não está explícita tal obrigação.
O segundo caso, ainda mais banal, é de um morador que não aceita guardar sua bicicleta no bicicletário e, diariamente, sobe e desce com ela pelo elevador social, se negando a utilizar as escadas ou o elevador de serviço. Advertido, disse que vai processar o condomínio, pois sente-se constrangido em seu direito de ir e vir.
Ao juiz que vai perder tempo para julgar tais processos desejo paciência e inspiração.
Márcio Rachkorsky
Advogado, é membro da Comissão de Direito Urbanístico da OAB-SP.