Profissionais, que correm 25 km por dia, estão expostos a cortes por cacos e furos de agulhas
Por: PEDRO FERREIRA
Nos últimos cinco anos, Carlos Gomes dos Santos,
33, sofreu vários acidentes de trabalho: teve um corte profundo na perna, outro
no dedo da mão, foi atropelado por uma moto e perfurado duas vezes por seringas
hospitalares usadas. O gari faz parte de um batalhão de 530 profissionais que,
diariamente, percorrem 25 km de ruas e avenidas de Belo Horizonte coletando
lixo domiciliar e do comércio. Pelo menos cinco deles sofrem cortes profundos
todo mês, por conta dos resíduos mal-acondicionados.
E esse “trabalho sujo”, como muitos assim enxergam, é de alto risco por conta
da falta de compreensão e de educação, principalmente da população, que deveria
embalar melhor seus dejetos e contribuir para a garantir a segurança desses
profissionais.
De acordo com a Superintendência de Limpeza Urbana (SLU), os acidentes
envolvendo garis na capital são constantes. Os profissionais acabam se ferindo
com objetos cortantes e pontiagudos, como cacos de vidro, lâminas, pedaços de
espelho, latas de alimentos em conserva, espetos de churrasco, lâmpadas
fluorescentes e seringas hospitalares usadas. Nesse último caso, por haver
risco de contaminação, o gari fica seis meses afastado do trabalho, em
tratamento, e quem perde é a própria população.
“Não tem como a gente evitar os riscos. A todo instante, a gente está na rua e
pode acontecer um imprevisto, tanto pegando o lixo dos moradores como também
riscos no trânsito”, disse Carlos Santos, que cortou a perna com um pedaço de
espelho quebrado que colocaram em um saco preto. “No que eu peguei o saco e saí
correndo atrás do caminhão, ele bateu na minha perna e me cortou. Levei dez
pontos”, conta o gari.
Ele também afirma que foi atropelado por uma moto e, há poucos dias, cortou um
dedo da mão e levou cinco pontos. “Fui perfurado duas vezes com seringas
hospitalares colocadas em sacos de lixo. Não colocam as seringas da maneira
correta, dentro de garrafas, mas numa sacola, de qualquer maneira”.
Os garis chegam a atingir velocidade de 7 km/h correndo atrás dos caminhões em
movimento para depositar o lixo. “É preciso a cooperação dos outros motoristas
no trânsito. Infelizmente, muitos reagem com impaciência, não levando em
consideração a importância do trabalho realizado pelos garis”, informou a SLU.
Muitos colegas de equipe de Santos também sofreram acidentes. “Um deles foi
puxar o lixo e veio uma madeira e bateu no rosto dele. Quase furou o olho.
Outro trabalhava comigo à noite e perdeu praticamente todos os dentes quando
correu e bateu a boca num fio esticado pela Cemig”, disse.
HIV. Em alguns casos, os garis feridos com seringas são obrigados a
tomar coquetel anti-HIV. Muitos não informam acidentes de trabalho com medo de
perder o emprego.
Responsáveis. A segurança dos profissionais da limpeza da capital é
de responsabilidade da Superintendência de Limpeza Urbana (SLU), de empresas
terceirizadas e da própria população, segundo o órgão.
Proteção. As empresas terceirizadas são obrigadas a oferecer
equipamentos de proteção individual, como luvas, calçado e vestimenta.
Caminhões. Mais de 200 caminhões de lixo cruzam diariamente a
cidade de Belo Horizonte. Em 2018, a SLU recolheu mais de 680 mil toneladas de
rejeitos nas residências e comércio da capital.
Cheiro forte de dejetos incomoda só os outros
Com o passar do tempo, Santos disse não se incomodar tanto com o cheiro forte
do lixo. “Agora, para minha esposa, quando eu chego em casa, o cheiro já a
incomoda bastante. Quando entramos no ônibus, voltando do trabalho, ficamos até
sem graça de sentar perto do pessoal. Mesmo quando tem assento disponível,
preferimos ficar em pé, perto da porta, para não incomodar as pessoas”, disse.
O gari conta, ainda, que eles são vítimas de preconceito e de brincadeiras, mas
que isso tem diminuído com o tempo. “Hoje, quem conversa mais com a gente são
as pessoas mais experientes, que sabem que o nosso trabalho é sofrido. Quem
mexe mais com a gente são esses meninos de escola, que passam e chamam a gente
de ‘cheiroso’”, comentou Santos.
Na segunda e na terça-feiras, como há lixo acumulado do fim de semana, ele
conta que pega serviço às 8h e só termina a coleta às 18h, recolhendo de 25 t a
30 t de resíduos por dia.
Funcionário que se acidenta com seringa é afastado
O gari que se acidenta com seringa descartável, que pode estar contaminada, é
encaminhado para o serviço de saúde e fica seis meses afastado do trabalho para
tomar uma série de medicações e vacinas.
De acordo com a chefe do departamento de políticas sociais e mobilização da
Superintendência de Limpeza Urbana (SLU), Ana Paula da Costa Assunção, os
acidentes mais comuns são com cacos de vidro e seringas. “São feitas campanhas
orientando a população sobre o correto acondicionamento dos resíduos”, disse,
lembrando que os garis recebem equipamentos de proteção individual. “A luva não
consegue garantir totalmente a segurança, principalmente quando se trata de
seringas e vidro”, alertou.
Como condicionar o lixo corretamente
1 – Acondicione vidros e itens pontiagudos ou cortantes em garrafas
PET lacradas ou em embalagens longa vida;
2 – Pressione as tampas das latas de alumínio para dentro antes de
descartá-las;
3 – Quebre espetinhos de churrasco e, se possível, vede-os em
caixas de sapato;
4 – Não jogue fora líquidos no lixo comum, principalmente os
tóxicos e ácidos;
5 – Descarte lâmpadas fluorescentes somente em locais apropriados,
como lojas que as recebem;
6 – Informe que há vidros no saco de lixo ou entregue a embalagem
nas mãos do gari;
7 – Evite jornal para envolver materiais cortantes;
8 – Use sacos de lixo reforçados para que não se rompam e espalhem
materiais nas ruas;
9 – Quem faz uso de insulina deve guardar as agulhas usadas em
garrafas, que devem ser lacradas antes do descarte;
10 – Coloque garrafas de vidro intactas ‘em pé’ em uma caixa de
papelão ou as descarte em pontos de coleta seletiva.
Fonte Jornal O Tempo
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